Entenda a lei Áurea

Após um processo lento e gradual de várias leis que aos poucos afrouxaram a rigidez contra os escravos, a Lei Áurea os liberta

Sancionada pela Princesa Isabel em 13 de maio de 1888, enquanto regia o Império em nome de seu pai Dom Pedro II, a Lei Imperial de nº 3.353 foi responsável pela extinção do regime escravocrata que regia as relações sociais e comerciais do Brasil.

No ano anterior a sua sanção, o projeto de Lei que continha essa matéria foi elaborado e apresentado pelo senador Rodrigo Augusto da Silva. Após ser aprovada pelos senadores no Senado Imperial, em dois dias a Princesa Regente sancionou a mesma.

Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Bourbon-Duas Sicílias e Bragança se tornou herdeira do trono brasileira devido a morde de seus dois irmãos homens. Apesar de não ter sido preparada, durante sua formação, para assumir o trono, atuou três vezes como regente do Império enquanto seu pai se encontrava fora do Brasil.

Durante a terceira vez, enquanto D. Pedro II viajava pela Europa em busca de tratamento para sua frágil saúde, a Princesa Regente sancionou a Lei Áurea, declarando a ‘liberdade dos escravos’.

Economia imperial e outras leis abolicionistas

Diferente do que algumas vezes se pensa, a abolição da escravatura foi um processo lento e gradual, já que uma ação brusca e repentina desestruturaria a economia do país, por não existir condições de substituir repentinamente todos os escravos por trabalhadores assalariados, por exemplo.

Além disso, existia uma grande pressão vinda da Inglaterra, a principal parceira comercial do Brasil, há um bom tempo, que por intenções de se beneficiar economicamente, pressionava o Brasil para interromper esse regime. A intenção do país Inglês era dominar o continente africano e expandir seu mercado consumidor (na lógica inglesa, caso o Brasil eliminasse os escravos, seria obrigada a consumir mão de obra assalariada administrada por ela).

A movimentação em prol do fim do regime escravocrata brasileiro teve início em meados de 1831, com a Lei Barbacena, que proibia o tráfico inter atlântico de escravos. Ou seja, teoricamente o Brasil estava proibido de receber escravos vindos da África, mas pelo fato de os brasileiros não se esforçarem para realizar uma fiscalização que garantisse a eficácia dessa lei, ela não surtiu o efeito esperado.

Nesse momento, referente a Lei Barbacena, cunhou-se a expressão “lei para inglês ver”. Isso ocorreu pois, basicamente, essa lei só serviu para tentar satisfazer os interesses da Inglaterra e diminuir a pressão desta em cima do Brasil. Entretanto, essa Lei ocasionou o efeito reverso, já que a pressão inglesa em cima do Estado brasileiro somente aumentou.

Em 1845, foi criada na Inglaterra a Lei Bill Aberdeen, que concedia ao Estado inglês o poder de interceptar e apreender navios que transportassem escravos pelo oceano. Essa lei afetava especialmente o Brasil e, os comandantes que fossem pegos pelos fiscais Ingleses, eram multados e, algumas vezes, presos. Quando isso acontecia, era hábito os ingleses jogarem no mar os escravos que estavam sendo transportados, com o objetivo de apagar vestígios de tráfico de escravos naquela região.

Somente quando a Lei Eusébio de Queirós foi sancionada no Brasil, em 1850, é que foi terminantemente proibido o tráfico de escravos africanos para o território brasileiro. Diferente da lei implantada em 1831, havia fiscalização sobre a carga dos navios; o que fez com que o preço dos escravos aumentasse ainda mais, já que não podiam ser mais traficados e a quantidade dentro do território brasileiro passara a ser limitada.

A partir da metade da década, o movimento abolicionista ganhou força e trouxe turbulência à situação dos escravos no Brasil, incentivando fugas em massa e formação de associações abolicionistas.

Com a aprovação da Lei Eusébio de Queirós, adquirir escravos passou a ser mais complicado e, consequentemente, mais caro. Esse fator incentivou o aumento da imigração de trabalhadores assalariados vindos da Europa. Diferente dos escravos, que quando adquiridos, custavam um valor alto e fixo que era pago adiantado aos seus ‘donos’, os assalariados consistiam em mão de obra barata que não demandava pagamento adiantado e muito menos fixo.

A partir dessa década, a exportação do café, as casas bancárias e das bolsas de valores, as estradas de ferro e a oligarquia agrícola passaram a reger a dinâmica capitalista que passou a estar presente no Brasil. Assim, no momento em que o Brasil se encontrava, já não era mais tão economicamente viável aos cafeicultores comprar escravos para trabalhar em suas terras.

Como durante esse período permeava a doutrina legal de que “o parto seguia o ventre” (partus sequitur ventrem). Ou seja, se a mãe era escrava, o filho seria escravo. Se era liberta (alforriada), o filho seria liberto. Se era livre, seria livre. Nesse contexto, em 1871 foi aprovada a Lei do Ventre Livre, onde filhos de mães escravas não seriam mais considerados escravos a partir da data de sanção daquela lei.

Outra lei de cunho abolicionista foi a Lei dos Sexagenários (de nº 3.270), que, em 1885, ano em que se teve um aumento significativo dos grupos que se engajavam em prol da libertação dos escravos, declarou libertos todos aqueles considerados escravos que tivessem mais de sessenta anos de idade.

Apesar de toda essa movimentação ter durado mais de trinta anos, D. Pedro II havia chegado a se articular politicamente em prol desse objetivo, o que fez com que as camadas abolicionistas aumentassem cada vez mais a pressão em cima das ações do representante real. Com isso, as articulações que começaram a ser construídas, apesar de agradarem o movimento abolicionista e os políticos liberais, enfurecia os fazendeiros escravocratas, os colocando contra o regime imperial.

Quando D. Pedro II se ausentou do país em busca de tratamento médico, o clima revolucionário e a onda abolicionista estava em seu auge no Brasil, a Princesa Isabel, que se encontrava regente do país naquele momento, se viu obrigada a ceder. Assim, em 13 de maio de 1888, foi sancionada a Lei Áurea.

Lei Áurea na íntegra

Art. 1°: É declarada extincta desde a data desta lei a escravidão no Brazil.

Art. 2°: Revogam-se as disposições em contrário.

Manda, portanto, a todas as autoridades, a quem o conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que a cumpram, e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nella se contém.

Edição “Gazeta de noticias” Lei Áurea em 1888

Repercussões e controvérsias sobre a abolição

A proibição e o fim da escravidão impactaram a atual situação do país, especialmente quando se trata da queda do Império e da ascensão da República.

Apesar da popularidade da Princesa Regente ter ficado alta pós-abolição, e ter sido, inclusive, reconhecida pelo Papa Leão XIII, não foi suficiente para manter o Império no poder. Dada a sua excessiva perda de poder, em 1889 foi possível proclamar as justiça expulsar a família imperial do Brasil.

Entretanto, pelo fato de a abolição não ter sido fruto de um planejamento, e sim de uma atitude desesperada de salvar a própria pele realizada pela realeza portuguesa, os mais de 700 escravos que foram libertos foram “abandonados” à própria sorte. Não tinham estrutura, nem emprego. Por isso, muitos permaneceram nas fazendas onde inicialmente eram escravos, recebendo uma quantia mínima,  para se sustentar, ou começaram processos de migração.

Curiosidades

“Áurea” significa “ouro”.  Seu nome foi atribuído à lei pois se referia ao período sem escravidão como um período de iluminação pelo qual o Brasil passou pós “escuridão”.

No dia da abolição, cerca de 10 mil pessoas rodearam o palácio do governo do Rio de Janeiro, o Paço Municipal, à espera da princesa Isabel, que chegou por volta de 3 da tarde e portava um vestido de seda cor nude.

Aproximadamente um ano após o fim da escravidão, Rui Barbosa queimou todos os documentos  sobre escravidão que encontrou, em prol de “acabar com o passado negro existente ali”.

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